Tá vendo aquele edifício, moço? Ajudei a levantar Foi um tempo de aflição Eram quatro condução Duas pra ir, duas pra voltar Hoje depois dele pronto Olho pra cima e fico tonto Mas me chega um cidadão E me diz desconfiado "-Tu tá aí admirado, Ou tá querendo roubar?" Meu domingo tá perdido Vou pra casa entristecido Dá vontade de beber E pra aumentar o meu tédio Eu nem posso olhar pro prédio Que ajudei a fazer Tá vendo aquele colégio, moço? Eu também trabalhei lá Lá eu quase me arrebento Pus a massa, fiz cimento Ajudei a rebocar Minha filha inocente Vem pra mim toda contente "-Pai, vou me matricular" Mas me diz um cidadão "-Criança de pé no chão Aqui não pode estudar" Esta dor doeu mais forte "Por que fui deixar o norte", Eu me pus a me dizer Lá a seca castigava Mas o pouco que eu plantava Tinha direito a comer Tá vendo aquela igreja, moço, Onde o padre diz amém? Pus o sino e o badalo Enchi minha mão de calo Lá eu trabalhei também Lá sim, valeu a pena Tem quermesse, tem novena E o padre me deixa entrar Foi lá que Cristo me disse "-Rapaz, deixe de tolice Não se deixe amedrontar Fui eu quem criou a Terra Enchi os rios, fiz a serra Não deixei nada faltar Hoje o homem criou asas E na maioria das casas Eu também não posso entrar"