Bem podes tu guardar os dons da formosura Que o tempo, um dia, há de implacável, trucidar! Bem podes tu viver ufana da ventura Que a natureza, cegamente quis te dar! Prossegue embora, em tuas glórias sendas, sempre avante De gáleas plenas em teu sólio triunfante! Que enquanto a morte em vibre em ti, funéreo golpe seu A natureza irá roubando o que te deu E quanto a mim, irei cantando o meu ideal de amor Que é sempre novo no viçor da primavera! Na lira austera em que o senhor me fez tão destro Será meu estro só de quem for imortal Tu podes bem, sorrir das minhas desventuras Pertenço a dor e gosto até de assim penar E eu tenho não'alma um grande cofre de amargura Que é meu tesouro e que ninguém pode roubar! Pois, quando a dor me vem pedir alguma esmola Eu lhe descerro as portas d’alma, que a consola! E dou-lhe lágrimas que vão lhe mitigar o ardor Que a inspiração dos versos meus, só devo a dor Irei sonhando com o tristor da solitária flor Dragando amor ao que for grande d’alma! Darei a palma quem tiver maior pureza Voto a beleza, por si só mortal horror! Terei mais glória em conquistar com sentimentos Pensantes almas de varões de alto saber! E com amor e com pujança de talento Fazer lhe a alma ternas lágrimas verter Isso é mais nobre, é mais sublime, edificante! Do que vencer um coração ignorante Porque a beleza é só matéria e nada mais traduz! Mas, o talento é só espírito e só luz Descantarei na minha lira das estrelas ao seu fulgor Da flor ao mago olor que tem saudade de despertar Orgulho dás, eu brancarei que eu ademar, vem derramar! São fontes aceleradas que vem lhe amar Por isso, a rosa que se embalem e se debruça Em neve, em leve anil! A brisa que soluça E que nos valem glória ao mar! Da branca Lua, caça a loucuras resplendente! Mas, há somente para os bardos virem inspirar Mas, quando a barca conduzir-te à sepultura O teu orgulho em podridão, reduzirá! Iram os vermes desflorar-te a sua formosura De ti na Terra, ninguém mais se lembrará Mas, quando a morte rematar os meus dissabores Serei lembrado pelos bardos trovadores! Que em versos meus, oh, minha lira em traduções gemer Que eu, morto, embora, nas canções, hei de viver!