De onde avisto a querência O açude é um céu dentro d'água Lâmina azul refletindo Tudo o que o tempo deságua Aprisionado em limites Contido, longe se espelha Pois entre as duas coxilhas Surge uma várzea parelha Tudo que o céu guarda em si O açude mostra também Menos as suas vontades De querer ir mais além Quando um desaba no outro Com temporal e tormenta Acordam as sangas por diante Deixando a água barrenta O açude em águas calmas É tudo o que o céu quiser Pois vive das suas chuvas Ou de uma nascente qualquer Nas margens da grama verde O gado pasta a planura E mata a sede das tardes Bebendo o céu nas lonjuras O céu se pinta em estrelas Em águas anoitecidas Que a Lua deixa de manso Um risco em luz refletida São nestas horas que a noite Fica o olhar calmamente O bote de uma traíra Contra uma estrela cadente O vento que empurra as nuvens Faz maretas no açude E o céu não para, espelhado Torcendo que o tempo mude Vão os dois pra o mesmo lado Até chegar na vazante O açude para nas taipas E as nuvens seguem por diante O açude é um céu dentro d'água E a mesma cena ao inverso Guardando dentro um mistério Que existe em seu universo Que as garças, que voam longe Levam o céu pelas asas Depois, devolvem ao açude Pousando nas águas rasas Passa tanto céu na água E o açude segue o mesmo